Dream beneath a desert sky
Eve e Joana tiveram um almoço calmo conversando um pouco sobre coisas banais. Bevin não saiu do quarto, como era de esperar, mas conforme Eve disse, a birra não ia durar muito mais do que aquilo.
Era uma Quinta-feira, a ultima do mês, e segundo ela, haveria reunião do condomínio no prédio, enfim, para tratar de assuntos pendentes sobre as obras feitas recentemente no elevador, e as telhas que foram colocadas para reforçar o combate contra o Inverno rigoroso que estava à porta. Evelyn não tinha vontade nenhuma de tratar dessas burocracias que só a obrigavam a pagar umas massas extra para pagar as reparações. E o facto de se juntar durante meia hora com as vizinhas do andar de cima fazia-a ficar com pele de galinha.
Joana ofereceu a sua companhia mas Eve garantiu que esta ficaria a descansar um pouco, e assim decidir se no dia seguinte deveria ir a um médico ou não. Ela pensou que a perda de memória fosse algo relacionado com algum choque ou acidente que tivesse acontecido e era sempre mais seguro fazer alguns exames. Joana concordou, embora um pouco assustada com a hipótese de perder para sempre a memória da sua vida. Será que havia pessoas que a procuravam por aí? A ideia fazia-lhe calafrios e sentiu-se novamente sozinha, mesmo na companhia de Evelyn.
- Queres tomar um banho? Deves estar a precisar e talvez te faça relaxar. – Pergunta Eve levantando a loiça da mesa.
- Hum, talvez seja isso que esteja a precisar. – Ou não deveria ser necessariamente mas relaxar ajudaria.
Esta tentava despachar os copos e as canecas que estavam amontoados na banca. Passava um esfregão rapidamente neles para haver espaço para a restante loiça. Duas pessoas não sujavam assim tanto mas a pequena banca já estava sobrecarregada até cima antes de Joana lhe pegar.
- Oh, não, não te preocupes com isso! – Disse-lhe ela afastando-a para o lado enquanto colocava mais uma pilha de pratos em cima do monte. - Então… a casa de banho fica já à direita. – Informou Eve apontando para a porta. – As toalhas estão debaixo do lavatório e podes vestir algo meu se quiseres, no meu quarto, procura lá. – Depois de largar tudo de maneira a não cair encostou-se à bancada de frente para ela.
Joana esboçou-lhe um sorriso rápido enquanto secava as mãos ao vestido. Depois saiu num passo rápido procurando meia alheia o quarto de Eve, ou melhor, o seu quarto.
Evelyn riu-se distraída e sacou um maço de tabaco do bolso. Não era apenas um banho que a fazia relaxar.
Eve e Joana tiveram um almoço calmo conversando um pouco sobre coisas banais. Bevin não saiu do quarto, como era de esperar, mas conforme Eve disse, a birra não ia durar muito mais do que aquilo.
Era uma Quinta-feira, a ultima do mês, e segundo ela, haveria reunião do condomínio no prédio, enfim, para tratar de assuntos pendentes sobre as obras feitas recentemente no elevador, e as telhas que foram colocadas para reforçar o combate contra o Inverno rigoroso que estava à porta. Evelyn não tinha vontade nenhuma de tratar dessas burocracias que só a obrigavam a pagar umas massas extra para pagar as reparações. E o facto de se juntar durante meia hora com as vizinhas do andar de cima fazia-a ficar com pele de galinha.
Joana ofereceu a sua companhia mas Eve garantiu que esta ficaria a descansar um pouco, e assim decidir se no dia seguinte deveria ir a um médico ou não. Ela pensou que a perda de memória fosse algo relacionado com algum choque ou acidente que tivesse acontecido e era sempre mais seguro fazer alguns exames. Joana concordou, embora um pouco assustada com a hipótese de perder para sempre a memória da sua vida. Será que havia pessoas que a procuravam por aí? A ideia fazia-lhe calafrios e sentiu-se novamente sozinha, mesmo na companhia de Evelyn.
- Queres tomar um banho? Deves estar a precisar e talvez te faça relaxar. – Pergunta Eve levantando a loiça da mesa.
- Hum, talvez seja isso que esteja a precisar. – Ou não deveria ser necessariamente mas relaxar ajudaria.
Esta tentava despachar os copos e as canecas que estavam amontoados na banca. Passava um esfregão rapidamente neles para haver espaço para a restante loiça. Duas pessoas não sujavam assim tanto mas a pequena banca já estava sobrecarregada até cima antes de Joana lhe pegar.
- Oh, não, não te preocupes com isso! – Disse-lhe ela afastando-a para o lado enquanto colocava mais uma pilha de pratos em cima do monte. - Então… a casa de banho fica já à direita. – Informou Eve apontando para a porta. – As toalhas estão debaixo do lavatório e podes vestir algo meu se quiseres, no meu quarto, procura lá. – Depois de largar tudo de maneira a não cair encostou-se à bancada de frente para ela.
Joana esboçou-lhe um sorriso rápido enquanto secava as mãos ao vestido. Depois saiu num passo rápido procurando meia alheia o quarto de Eve, ou melhor, o seu quarto.
Evelyn riu-se distraída e sacou um maço de tabaco do bolso. Não era apenas um banho que a fazia relaxar.
***
Ivone aplicou o batom cor-de-rosa. Depois olhou-se no espelho e colocou de imediato um pouco de blush. De seguida olhou para a face redonda e rosada, e apostou num tom violeta para as pálpebras. Estava pronta. Passou rapidamente uma escova no cabelo e enrolou à volta dos pulsos um molho de pulseiras. Agora sim.
O Sol matinal entrava pela janela do quarto. As cortinas opacas e pesadas haviam sido repuxadas para os lados a fim de deixar entrar toda aquela aragem pela manhã. Não era hábito Ivone fazer aquilo, mas queria sentir-se especialmente fresca e confiante naquele dia, e nada melhor que uma boa dose de luz para acordar.
António já estava a trabalhar, mas por aquela altura a tasca não tinha muito movimento, pelo que Ivone falou que era preferível saírem cedo do que depois terem de aguentar as queixas dos clientes quando apenas uma pessoa, a filha mais velha do casal, se encarregava do negócio na hora de ponta.
Marília Costa tinha apenas 17 anos, mas tinha desistido dos estudos há já um ano, quando era repetente por 4 anos consecutivos. Depois de andar todo esse tempo a passear os livros da escola para casa e vice-versa, chegou à conclusão que havia de se safar muito melhor se fosse para o mercado de trabalho. Era jovem e desenrascada, não haviam de faltar oportunidades. Agora era ajudante de cabeleireira no salão de beleza da tia, e de vez em quando dava uma ajuda no café dos pais. Tinha uma vida social fora disso mas arranjava tempo para tudo. Depois havia Jorge, um rapaz de 12 anos que mal parava em casa depois das aulas. A bola dentro da mochila era o essencial todos os dias para que tudo corresse bem!
Era assim a vida daquela singela família. Todas as alegrias, desgraças, especulações eram todas geradas em torno do pequeno bairro onde habitavam juntamente com outras famílias semelhantes.
***
Joana entrou na casa de banho pela primeira vez. Estava tão húmida e gélida como o ambiente lá fora. Pela primeira vez sentiu que toda ela assim o estava também.
Pousou o monte de roupa em cima do tampo da sanita e tratou de tirar duas toalhas do sítio que Eve mencionou. Pousou-as em cima do lavatório. Levantou o olhar e deparou-se consigo reflectida no espelho. Endireitou-se e olhou mais atentamente. Era jovem, bastante. Mas não aparentava ser muito mais do que Bevin, pelo menos fisicamente. Era baixa e magra. Mais baixa do que magra. Tinha cabelos loiros esticados e escalados dos ombros até meio das costas. Vergava um vestido azul atlântico com um decote recto e simples com mangas curtas. Os braços desciam pelo corpo, esguios e brancos como neve, tal como todo o resto. Considerou-se uma rapariga bonita… mas não se considerava um “eu” a sério, apenas via uma desconhecida reflectida no espelho.
Suspirou enquanto desapertava o vestido. Sentiu um arrepio na espinha quando este deslizou e caiu no chão aos seus pés. Foi então que viu algo no espelho a brilhar junto ao seu peito. Era um fio prateado com qualquer coisa brilhante pendurada. Pegou nela com a ponta dos dedos. O pequeno coração de prata fazia-se maravilhar aos seus olhos confusos. Olhou com detalhe quando pensou ter visto algo gravado nele. Um “J”. Rodou a pequena medalha para poder ver a gravura. Estava escrito, “Um gesto para o amor eterno.” Com letras muito pequenas.
- Um gesto para o amor eterno… - Murmurou entre dentes abanando a cabeça.
A frase não estava escrita em Inglês. Mas percebia-a. Mas não lhe dizia absolutamente nada. Como é que isso era possível? E o “J”, poderia ele indicar alguma coisa? O seu nome talvez, e isso já era um grande passo, pensou.
Desapertou o fio com um certo cuidado e pousou-o ao canto do lavatório.
Entrou na banheira a tremer, matutando no assunto. Tinha um enigma para decifrar. Era algo que a fascinava de facto, enigmas, mas este era deveras assustador. Abriu a torneira, abstraída de tudo à sua volta. O chuveiro por cima da sua cabeça cuspiu uma corrente de água fria tão repentina quanto foi o impulso de fugir dela.
***
Carla saiu de manha cedo. Marcavam oito e um quarto no seu pulso e já se aposentava no consultório médico. Aquele era um espaço grande, arejado e luminoso. Muito bem-parecido. Olhava em volta enquanto o copo de café fumegava em cima da mesa. Supunha que fosse aquele o pequeno-almoço de todo o pessoal que havia ficado com o turno da noite.
Bastava ficar umas horas retida num hospital para se habituar àquele ritmo e hábitos. Não que essas horas bastassem para se sentir familiarizada com tudo aquilo que a rodeava.
Não devia de faltar muito para completar nove anos desde a morte do marido. Cerca de dez anos e meio desde que lhe foi diagnosticado cancro num pulmão. E tudo isso apenas 3 anos depois de Sofia nascer. Pobrezinha, mal conheceu o pai.
Miguel foi o pilar que sustentou Carla. E estava-lhe eternamente grata por tudo, mesmo ainda com um enorme buraco no coração pela sua morte tão prematura. Miguel foi um ombro amigo, fiel e sempre presente. Miguel foi seu marido que a aceitou e acolheu com uma criança pequena e sem pai. Miguel foi quem lhe proporcionou um lar e uma família. E ela amara-o, tanto quanto foram as lágrimas derramadas no momento da despedida. Mas seguira em frente. Joana tinha seis anos e Sofia três. As duas não mereciam que a mãe também desaparecesse do seu alcance, por isso sempre esteve lá, de corpo e alma. Se até ao momento Miguel fora os seus alicerces, então a partir dali ela própria seria os alicerces das suas pequenas.
E ali estava, de novo para enfrentar algo que ainda não sabia bem o que era, mas impossível de não se esperar o pior. E no mesmo lugar. Deu para concluir que não mudou muita coisa. Um lugar de opressão e dor e onde a esperança já se foi. Mas também onde as vidas de toda a gente eram reconstruídas à medida que o tempo passava, dentro naquelas paredes verde mentol. Podiam passar meses ou ser apenas uma questão de minutos que tudo virava de pernas para o ar.
- Desculpe a demora.
O homem entrou de rompante fazendo Carla parar de torcer um papel e dar um salto na cadeira.
- Estive agora com a sua filha. – Sentou-se à sua frente e baixou os óculos de leitura. - Carla Novais, certo?